
Um torcedor que entrasse em coma na segunda-feira da semana e acordasse só agora se assustaria em saber do vaivém no comando do futebol brasileiro desde que caiu em sono profundo.
Traumatizado com os 7 a 1, o torcedor apagou imaginando que a contratação de Carlo Ancelotti para a seleção brasileira representava duas boias de salvação.
Uma, a mais óbvia: a chance de tirar a equipe do lodo da mediocridade que se enfiou desde que Thomas Müller e companhia começaram a empilhar gols contra a defesa nacional. Isso num já distante 2014.
A outra boia (tá, nem tão menos óbvia) era garantir a sobrevida de Ednaldo Rodrigues, chefão da CBF e alvo de uma reportagem recente da revista piauí.
O perfil mostrava um dirigente disposto a torrar o dinheiro da confederação com viagens, hospedagens e parcerias milionárias com amigos e potenciais aliados.
Não era qualquer coisa, e dessa vez não tinha Neymar fazendo malabarismo para desviar o foco e iludir o torcedor que mantém estocados os fogos para o hexa desde 2006 (sdds quarteto mágico).
Ednaldo foi, então, à luta. Abriu a carteira, mandou emissários para a Espanha e eles voltaram com o técnico Carlo Ancelotti na bagagem.
O troféu foi exibido em fala pública:
“Trazer Carlo Ancelotti para comandar o Brasil é mais do que um movimento estratégico. É uma declaração ao mundo de que estamos determinados a recuperar o lugar mais alto do pódio. Ele é o maior técnico da história e, agora, está à frente da maior seleção do planeta. Juntos, escreveremos novos capítulos gloriosos do futebol brasileiro”, disse o futuro ex-presidente da CBF.
Segundo Ednaldo, o impacto de Ancelotti iria além de resultados. “Ele é um estrategista que transforma equipes em lendas. O Brasil, com sua tradição única, e Ancelotti, com sua visão revolucionária, formarão uma parceria que vai entrar para a história.”
A notícia chegou com alguns anos de atraso.
Ancelotti era o técnico favorito para assumir a seleção após a saída de Tite. Mas ele andava ocupado demais empilhando taças pelo Real Madrid.
“Uma hora ele vem”, pensaram os comandantes do futebol brasileiro. A saída de emergência foi colocar Fernando Diniz para esquentar o banco do treinador italiano. Durou seis jogos.
Na época Ednaldo estava afastado do comando da CBF. Mal retornou, por ordem do ministro do STF Gilmar Mendes, e ele decidiu dar fim ao dinizismo na seleção.
Apostou, assim, em Dorival Jr. Deu no que deu.
A queda de Dorival, após uma paulada contra a Argentina, levou Ednaldo a abrir negociações com ao menos técnicos estrangeiros. Cozinhou Jorge Jesus e levou Ancelotti.
Alguém precisa agora avisar o treinador que o contratante não estará à mesa da diretoria quando ele se apresentar para o primeiro dia de trabalho, no Rio.
No lugar de Ednaldo estará um desconhecido dirigente eleito, um ano antes, para comandar o futebol de Roraima. Mas que reuniu apoio suficiente de outras federações para disputar o cargo ba CBF em chapa única. Falta pouco mais de um ano para a Copa de 2026.
Samir Xaud, o futuro chefe do futebol brasileiro, tem 41 anos, é medico de formação e nepobaby. O pai dele comandou o futebol roraimense durante quatro décadas. O sucesso pode ser medido pela contribuição dos times e craques locais para o futebol brasileiro.
Fato é que, de uma semana para cá, o mundo capotou, e o torcedor dos primeiros parágrafos por pouco não morreu de novo. Desta vez, de vergonha.
Como explicar a Ancelotti a encrenca que ele acaba de assumir?
Até onde se sabe, a reviravolta não o fará mudar de ideia. Até segunda ordem, ele ainda é o futuro técnico da seleção.
Que não repare a bagunça quando chegar. É a especialidade da casa.