Há 1.500 dias Tite descobre o que é treinar a seleção brasileira . Trata-se de aprendizado que nunca acaba: às cobranças usuais, somam-se novas, como a necessidade de fazer a equipe voltar a ter uma sequência de bons jogos com menos horas de trabalho presencial que o previsto, devido à pandemia da Covid-19. Aos obstáculos tradicionais, acrescenta-se um outro, o de melhorar o desempenho tendo cada vez menos chance de testá-lo contra adversários fortes da Europa .

Tite
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Neste caminho de descobertas contínuo, Tite terá mais uma partida pela frent e hoje, às 21h, contra o Peru, em Lima, pelas Eliminatórias para a Copa do Mundo do Qatar. Trata-se de um jogo simbólico: será o 50º do técnico à frente do Brasil.

— Na seleção é preciso administrar o tempo porque você não está constantemente com os atletas, ela te retira um pouco do trabalho de campo e te deixa mais no campo dos estudos. E no momento em que busca o dia a dia você tem que ser muito pontual, preciso no treinamento e nas funções dos atletas. A seleção te tira o dia a dia, o cheiro do vestiário — resumiu Tite, comparando o trabalho na CBF à rotina que tinha nos clubes.

Desde o primeiro jogo, em setembro de 2016 (vitória de 3 a 0 sobre o Equador, em Quito), até o desta noite, o treinador experimentou a euforia gerada pelo ótimo começo de trabalho, a decepção com a derrota nas quartas de final da Copa do Mundo da Rússia e as cobranças pela queda de rendimento da equipe nos últimos jogos de 2019. Uma montanha russa emocional sustentada pelo ótimo aproveitamento de pontos: 78,2%. Desde 1980, apenas dois treinadores que fizeram 30 jogos ou mais à frente da seleção tiveram rendimento superior: Telê Santana, de 1980 a 1982, com 80% de aproveitamento, e Zagallo, que de 1994 a 1998 somou 79,6% dos pontos possíveis.

O que difere o trabalho de Tite dos antecessores é a dificuldade que o treinador enfrenta para medir até que ponto os resultados são um reflexo do patamar de sua equipe ou do (baixo) nível dos adversários. Nunca antes na história desse país o técnico da seleção jogou tão pouco contra adversários europeus, desde 2006 hegemônicos nos Mundiais.

Vítima do distanciamento europeu, um reflexo do calendário da Uefa, que isolou suas federações do restante do mundo, a seleção de Tite tem apenas 18% dos jogos contra selecionados do Velho Continente. Para se ter uma ideia, o Brasil de Telê fez 51% dos jogos contra europeus no ciclo que culminou na derrota para a Itália no Mundial da Espanha. Já a equipe de Zagallo, até perder a decisão de 1998 para a França, teve 37% das partidas com equipes da Europa como adversárias.


Os cinco jogos contra a Argentina e as duas partidas contra o Uruguai são responsáveis pela maioria esmagadora dos nove confrontos que o Brasil de Tite disputou contra seleções que já venceram o Mundial, outro termômetro importante para medir o nível de jogo da seleção pentacampeã. Foram apenas dois jogos contra europeus que contam com ao menos uma estrela bordada no alto do escudo: empate em 0 a 0 com a Inglaterra, no fim de 2017, e vitória de 1 a 0 sobre a Alemanha, no começo de 2018.

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Sem o embate com os mais fortes, resta ao Brasil administrar as impressões geradas por estatísticas descontextualizadas e por resultados expressivos contra seleções pouco expressivas. É o caso da goleada da última sexta-feira, quando aplicou 5 a 0 em uma Bolívia em frangalhos por causa de uma profunda crise institucional na sua federação.

Teste mais forte

Neste sentido, o jogo desta noite em Lima vale muito mais do que o passado, na Neo Química Arena. O Peru é reconhecidamente mais forte do que a Bolívia e os próprios resultados da seleção mostram isso: além de finalistas na Copa América de 2019, os peruanos venceram o Brasil em um amistoso disputado em setembro do ano passado.

— Teremos um adversário importante, com um grau de dificuldade técnica e física superior ao que enfrentamos. Temos que ter essa capacidade de contextualizar. Não estou pensando muito nos 50 jogos, penso numa ideia de futebol e que a equipe jogue muito. Que tenha a consciência que tem que criar e fazer gol, ser dura e dificultar ao máximo o adversário, se possível não tomar gol — enumerou Tite.

Para a partida, o treinador deve manter a escalação que iniciou o duelo com os bolivianos. A única dúvida fica por conta da entrada ou não de Richarlison no lugar de Everton, mais aberto pela direita. Na última coletiva antes do duelo, o técnico preferiu fazer mistério quanto ao escolhido:


— Não quero municiar o Gareca (Ricardo Gareca, técnico do Peru).

Uma mudança está certa e será na hierarquia em campo: a faixa de capitão, que foi de Casemiro na estreia nas Eliminatórias, será de Thiago Silva contra o Peru. Pelo visto, o treinador está disposto a trazer de volta o rodízio da braçadeira, algo que implementou na Copa em 2018 e que gerou questionamentos externos quanto à importância das trocas.

Em termos táticos, Tite terá uma nova oportunidade para colocar em prática o esquema que amadureceu mentalmente durante o hiato sem atividades da seleção, no auge da pandemia. Tite quer a seleção atacando com uma linha de cinco jogadores, dando liberdade para um lateral se juntar aos quatro já tradicionalmente posicionados mais próximos da defesa adversária.

Por causa da Covid-19, o Peru não terá os atacantes Alex Valera e Raúl Ruidiaz.

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