A repórter da TV Bandeirantes Isabela Labate já teve sua capacidade colocada em dúvida por ser mulher em um mundo dominado por homens
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A repórter da TV Bandeirantes Isabela Labate já teve sua capacidade colocada em dúvida por ser mulher em um mundo dominado por homens

Desde quando o esporte passou a ser praticado com fins de competição, a mulher teve sua importância rebaixada, sendo que no início dos Jogos Olímpicos, eram proibidas de entrarem nos locais de competição, seja para competir ou assistir as disputas. Com o passar dos anos, começaram a conquistar espaço como espectadoras e posteriormente como participantes do espetáculo, aos poucos alterando todo o cenário e criando sua própria importância dentro do esporte.

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Porém, apesar de já conviverem dentro do universo esportivo, elas ainda lutam para provar que são capazes de competir neste espaço dominado por homens e por pensamentos machistas e retrógrados. Dentro da imprensa, um mundo em que as mulheres vêm conseguindo grande espaço nos últimos tempos, o preconceito inicia dentro das próprias redações, nas quais colegas colocam em dúvida a capacidade de uma mulher que passe a se destacar.

"Nunca ninguém falou nada para mim, mas é aquela coisa 'fulano fala para ciclano que acaba chegando em você'. Claro que por eu ser muito nova, ser inexperiente como repórter, surgindo logo como repórter de TV aberta e foi tudo meio rápido, então é obvio que a desculpa de muita gente é 'Ah ela é bonitinha, por isso ela conseguiu'. Ninguém enxerga tua competência, teu potencial e teu trabalho, é sempre melhor dar essa desculpa da tua aparência para justificar por que você conseguiu e as outras pessoas não conseguiram", disse a repórter Isabela Labate, da TV Bandeirantes, "Às vezes a própria mulher acaba sendo preconceituosa com outra mulher. É sempre mais fácil dar essa desculpa 'Ah, ela é bonitinha e por isso ela está lá'", completou.

Mayra Siqueira é repórter da Rádio Globo/CBN e já aprendeu a lidar com o preconceito por ser mulher envolvida na cobertura do esporte
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Mayra Siqueira é repórter da Rádio Globo/CBN e já aprendeu a lidar com o preconceito por ser mulher envolvida na cobertura do esporte

A repórter da Rádio Globo/CBN, Mayra Siqueira, concorda - "É muito maior (o preconceito) dos colegas, só que de forma mais velada. Do público existe, mas é algo que no geral não te afeta, pois se você for ligar para cada crítica que recebe você não vive, então você aprende a relevar. Vem muito mais dos colegas que se questionam o que você fez para conseguir aquela informação, como se você não pudesse conseguir uma informação como uma pessoa qualquer. E principalmente quando você está numa posição de comentarista, as pessoas tendem a contestar muito mais facilmente o que você diz ou tentam desmontar seu argumento simplesmente pelo fato de não aceitar que uma mulher pode estar falando isso", disse.

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A relação com o público muitas vezes é conturbada: "Em estádio principalmente tem muito torcedor que fala muita besteira", disse Isabela. Já Mayra aprendeu a lidar com o preconceito no esporte desde o início - "A primeira vez que me deparei com preconceito foi justamente na Trivela (site esportivo). Fiz um post no blog sobre as Eliminatórias da Copa do Mundo e um cara criticou e disse 'Também, tinha que ser mulher pra escrever tanta bobagem. Vai pra cozinha'. Fiquei baqueada na época.", lembrou, "Desde então, não me permiti mais fraquejar. Hoje lido com tranquilidade com essas manifestações ofensivas e machistas", completa.

"Dentro das quatro linhas" o preconceito também existe. Alguns jogadores e técnicos colaboram para perpetuar a segregação entre sexos na cobertura esportiva. Mayra lembra da relação conturbada, principalmente, com técnicos - "Já colocaram em dúvida minha capacidade. Tenho algumas situações repetidas, principalmente envolvendo o Muricy Ramalho, que questionou em entrevistas o meu conhecimento do assunto. O Leão também a mesma coisa. Isso aconteceu algumas vezes no mundo do futebol", disse.

Atletas também sofrem com preconceito

A jogadora do Corinthians Audax, Mayara Bordin, sofre com o preconceito com a mulher no esporte
Instagram/Corinthians
A jogadora do Corinthians Audax, Mayara Bordin, sofre com o preconceito com a mulher no esporte


Se na mídia as mulheres ainda estão conquistando o espaço e crescendo dia-a-dia, as atletas se consolidam com conquistas e resultados expressivos. Porém, mesmo com este crescimento que as coloca, muitas vezes, em níveis superiores aos homens, as atletas do País ainda sofrem muito com a diferença e com o preconceito.

"O maior preconceito vem da torcida. Primeiro por serem a maioria, segundo por serem quem faz o espetáculo andar, terceiro, porque visualmente são eles quem vão escolher o que gostam de ver ou não. Os outros setores, na grande maioria, gostam do futebol feminino, ou no mínimo são pagos pra gostarem e tentarem se adaptar, já a torcida não, eles têm que gostar do que visualizam pra poder acompanhar", disse Mayara Bordin, jogadora de futebol feminino da equipe do Corinthians Audax.

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Mayra Siqueira, que além de jornalista é atleta, vive os dois lados do preconceito com a mulher no mundo esportivo

Mayra Siqueira, que além de jornalista também compete em provas Master de Natação, acredita que exista o preconceito, mas que ele é mais leve do que o encontrado no jornalismo - "É muito comum o técnico e o colega se inclinarem a reclamar ou falar alguma coisa, fazer uma graça e falar que qualquer coisa de mulher é frescura, 'Ai que chatice! Tinha que ser mulher'. Esse tipo de alusão que é bastante comum, mas é algo muito mais ameno e mais brando que o jornalismo", disse.

Apesar de cada vez ser mais comum ver que as mulheres estão conquistando espaço dentro do mundo esportivo, este cenário está longe de ser favorável e deve demorar para que seja realmente percebida uma igualdade.

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"Esse negócio de preconceito, essas diferenças entre gêneros, é uma coisa muita antiga, mas ainda acontece muito. Acho que temos mostrado que mulher tem muita capacidade sim de trabalhar no esporte. Com o passar do tempo, se conseguirmos entrar mais e mais no meio esportivo, eu espero que isso acabe. Acabar não vai, pois sempre terá um ou outro que prefere acreditar que os homens são melhores que as mulheres, mas eu acho que não tem essa distinção. As pessoas tem que enxergar isso, tem que ter o respeito pela profissional mulher", afirmou Isabela.

ASSÉDIO

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Isabela Labate acredita que o importante é não se abalar com o assédio por ser mulher no jornalismo esportivo

"Acontece, mas de novo mais pelos colegas, pelo fato de ser mais homens que mulheres no meio. Quando aparece uma repórter nova é "Carne nova no pedaço",  todo mundo vai pra cima, é péssimo, mas acontece sempre" - Mayra Siqueira

"Existe assédio sim. Em estádio principalmente tem muito torcedor que fala muita besteira. Você tá ali pra trabalhar como um profissional qualquer. A gente escuta bastante e é claro que as vezes acontece de um entrevistado arranjar um jeito de dar em cima de você. O negócio é ter jogo de cintura e impor respeito" - Isabela Labate

"Na minha cabeça sofro assédio como qualquer pessoa normal. Mas como atleta e pessoa pública a gente tem que saber lidar muitas vezes de uma maneira mais branda, independente de estarmos gostando da situação ou não, pois o julgamento sempre vem acompanhado com a profissão que exercemos e não só pela pessoa que somos. Mas pra mim é tranquilo lidar com isso" - Mayara Bordin

CONSELHO PARA QUEM QUER SE AVENTURAR NO ESPORTE

"Seja forte, não titubeie, não se deixe levar pelas criticas e toma cuidado onde você pisa em primeiro lugar, saiba com quem você anda e as declarações que você dá, perto de quem você estiver por que infelizmente na oportunidade que tiverem pra te derrubar eles vão tentar fazer isso, não dá brecha. Infelizmente tem que ser assim por enquanto, mas as coisas vão mudando aos poucos" - Mayra Siqueira

"A mulher que quiser entrar no jornalismo esportivo ela tem que saber que não vai ser fácil. Pra mulher é mais dificil sim! Um erro é muito menos tolerável que o erro de um homem, digo isso no geral, pra público tb. Ela vai ser hostilizada no estádio, ouvir besteira de homem. O negócio é não se deixar abalar. Se esse é o sonho dela, ela tem que ir atrás. As mulheres já conquistaram muita coisa no mundo, falta muita coisa pra conquistar, infelizmente, mas eu acho que temos muita capacidade. A mulher é sempre muito guerreira, organizada. Então temos todas as condições de provar que trabalhamos igual a um homem, não tem essa distinção. Esse é o conselho que eu dou: Se ela quer, vai em frente, mostra que é capaz e que consegue. Seja forte, nada pode abalar a gente" - Isabela Labate

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Mayara Bordin joga futebol no Corinthians Audax

"Meu conselho seria pra que nunca perdesse o foco, que planejasse desde de cedo sua trajetória, e que tenha foco, determinação e disciplina nelas, que com certeza isso vai levar ela a chegar aonde ela quer. E que, além disso, não deixe de estudar, pois o estudo também forma um cidadão, além de um bom atleta. Juntando essas duas coisas, você será um atleta com mais escolhas na vida, pois ser atleta é muito difícil e muitas vezes pra ser bem sucedido não depende só da gente. Então precisamos ter outras opções também, pra não ficar à mercê do que a vida pode nos reservar. Temos sempre que ir em busca do melhor pra gente, seja qual forem as portas que se abram" - Mayara Bordin.

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